Conheça a primeira repórter trans da TV brasileira
Lisa Gomes cita apoio do marido, após sofrer com fala considerada transfóbica de Bruno, dupla de Marrone Reprodução/Instagram
Ofereceram à Lisa Gomes dias de folga, após a repórter ter sofrido com as falas consideradas transfóbicas de Bruno, dupla de Marrone. Mas ela preferiu voltar à rotina, ou pelo menos, tentar.
— Eu quero trabalhar. E isso é dar cara a tapa. Eu represento uma comunidade. Ao mesmo tempo, gravei ontem uma entrevista. Assim que peguei o microfone veio um medo: "o que vai vir agora depois que eu perguntar?", esperando o pior. Eu nunca fui invasiva com ninguém. Não saio para trabalhar e sofrer preconceito — lamenta Lisa, de 39 anos, que há dez anos trabalha na TV, integrando atualmente a equipe do "TV fama", da RedeTV.
A agressão ocorreu durante um evento sertanejo, em São Paulo, na última sexta-feira, dia 12. Bruno perguntou à repórter "se ela tinha peru", momentos antes da entrevista. Na ocasião, Lisa seguiu trabalhando, mas foi desligar a câmera que ela desabou.
— Eu continuei a matéria em respeito ao nosso público. Mas se você me perguntar o que eu estava perguntando na entrevista, já não lembro mais. Meu marido (Paulo Roberto) me acompanha em algumas pautas e estava lá no dia. Ele me pegou pela mão e disse: "vamos embora agora". No estacionamento, me abraçou, me beijou e disse que estaria comigo em todos os momentos, como sempre esteve — relembra a repórter, que começou a chorar no dia e durante a entrevista com o Extra: — Falei que não ia chorar mais. Mas as pessoas não têm noção de como tem sido difícil para mim.
Abrindo feridas
A fala de Bruno despertou inseguranças profundas de Lisa, que se viu nascer com um corpo que não se identificava. Natural de Recife, em Pernambuco, foi somente quando mudou para São Paulo, aos 19 anos, que a repórter iniciou a transição de gênero.
Lisa Gomes — Foto: Reprodução
— Foi quando comecei a entender o que se passava na minha cabeça. Também tinha aquele sentimento de não querer magoar a minha família. Eles me apoiam. Mas naquela época, eu não sabia e me anulava, guardava o que sentia. Foram dez anos nesse processo lento até "bater o martelo" e dizer: "é isso".
Desde então, a pernambucana tem tido acompanhamento profissional, além do suporte dos que a rodeiam. O que não significa que tenha todas as questões bem resolvidas.
Lisa Gomes é repórter de celebridades — Foto: Reprodução/Instagram
— Eu tenho inseguranças com meu corpo. Por isso, faço os tratamentos.
Pioneira
Primeira mulher trans a ser repórter de TV no Brasil, Lisa não imaginava que estava entrando para a história quando assinou contrato com a RedeTV há dez anos. Inicialmente, trabalhava no programa de João Kleber. Depois, foi realocada para o programa de Sônia Abrão e, agora, para o "TV fama".
— Eu não tinha noção de pioneirismo. Fui trabalhar porque precisava me sustentar e é isso que sei fazer. Depois que tive noção e quando paro e penso, vejo que é uma honra. Eu represento uma comunidade. Mas também fico triste por ser a única.
Aumentar a representatividade até mesmo na empresa que trabalha é uma das bandeiras que defende.
— Já briguei várias vezes na empresa para contratarem mais homens e mulheres trans. E mais do que isso, que fornecessem especialização, como eu tive e busquei, para que todos tenham oportunidades de se manterem nesse mercado.
E ela sonha mais.
— Quero ver ainda uma transexual sentada na bancada de um telejornal. Queria que fosse eu. Eu trabalho no entretenimento, sei que é difícil chegar na bancada no jornalismo. Mas não é impossível. Jogo para o universo. E bato na porta do diretor (risos).
Mas no fundo, Lisa sente que iniciativas, como essa, vão demorar um pouco. E os episódios de preconceito, como o que sofreu publicamente, acabam afastando outras pessoas trans.
— Assusta, porque ninguém quer passar por isso. Eu nunca tinha sofrido preconceito explicitamente dessa forma. Por isso, isso precisa acabar. A gente tem que gritar. Infelizmente, sei que vai demorar.
Aumentar a família
Não são só sonhos profissionais que rondam a mente de Lisa. Casada há cinco anos com Paulo Roberto, a jornalista quer aumentar a família.
— Sonho em ser mãe. Meu marido já tem três filhos, mas quero adotar uma menina. Já estamos conversando sobre isso, só que ainda não demos entrada em nenhuma documentação. É que temos mais algumas coisinhas para conquistar no momento. Tem a empresa dele, colocar nossa casa em ordem... E aí depois, vamos nessa.
Fonte - Portal Extra